Os contrários são, por vezes, duas pontas de uma mesma continuidade. Assim a temperatura (continuidade) por vezes é tratada como se houvesse duas entidades laqueadas dentro dela: o frio e o calor (Heráclito, fragmento 126); a noite e o dia, nos textos trocando de papel como se fossem entidades bem diferentes (ora a mãe a noite, a filha o dia, ora o contrário), nada os separa, a escuridão vai se transformando em luz e a luz em escuridão (Heráclito, fragmento 57). Delimitar fronteiras onde elas inexistem é um dos começos do Mal absoluto: cisão, separação, que depois nos leva a tomar partido (ou sou noite, ou sou dia; ou sou quente ou sou frio), vermo-nos e revermo-nos apenas em uma parte, de maneira que nós mesmos não nos percebemos como continuidade e conjunto. É preferível não determinar tanto e atravessar as fronteiras em paz.
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