Publicação em destaque

Átomos estéticos são também cognitivos

  “Quando vemos algo além de nossas expectativas, pedaços locais de tecido cerebral geram pequenos ‘átomos’ de afeto positivo. A combinação ...

28/12/2023

Estrelas e calendários - porquê?


É que, por vezes, interrogo-me sobre os fogos de artifício na passagem de ano. A viragem do ano pelo solstício (devia comemorar-se no solstício, ou de inverno ou de verão), pelo menos no hemisfério norte (onde a comemoração se desenvolveu), significa, pelo inverno, o fim do caminho para a morte e o começo do renascimento. No hemisfério sul indica o fim do aumento dos dias solares, o aquecimento que ainda vai seguir-se (como o frio em janeiro na metade norte), e o lento começo do encurtar dos dias. A viragem de ciclo, no lado norte (um norte relativo sem dúvida), implica o começo do renascimento, que trará flores na primavera e frutos nas duas estações seguintes. E comemora-se com fogo de artifício (não sei desde quando), estralejar de estrelas, explosões de fogo. Porquê?

Não sei. Porém, diz a ciência que o próprio mundo começou assim. Porquê?


 

24/12/2023

Montaigne dizia que

a própria liberalidade não está em seu verdadeiro esplendor quando em mão soberana, porque o rei, sê-lo, não deve a si. O que se faz é para servir.


(Gare do Oriente, Lisboa)

 

23/12/2023

Só através do coração sabemos...


essa ciência certa e subtil, há de estar relacionada com intuições, que são despertadas por emoções. Haverá talvez analogias afetivas a servir de ponte para contrastes e similaridades. Há, realmente, perceções anteriores a qualquer outra razão.


 

22/12/2023

Fábula da praia

O sol ainda não nascia, o dia nascia, o sol era como quando se punha no outro lábio do lago e, aparentemente pelo menos, era tudo muito simples.


 

19/12/2023

Jesus Cristo, celibatário, não defendeu



...o celibato obrigatório. Por coerência: nunca as falas (atribuídas a ele seguramente na Bíblia) postulam rumos antinaturais. A sua mensagem parece-me ser a de libertação, não de combate à natureza, é a natureza que se liberta com o Espírito, ou qualquer outro nome digno, quero dizer: que indique o mesmo. E ainda quando se dá a César o que é de César se reconhece que o Reino não é deste mundo, mas assiste a ele (no sentido etimológico do verbo assistir, que não é passivo), como assiste à natureza.
Manteve, portanto, o mandato: crescei, multiplicai-vos.

A relação disto com a foto? Simples: a foto mostra a conjugação dos elementos.

18/12/2023

Hino a Deméter


[...] a partir das raízes cem brotos de flor despontavam.
Dúlcido odor exalava, tão doce que tudo, do céu
À vasta terra e até a onda salina do mar lhe sorriu,
Maravilhada, buscou alcançá-lo com ambas as mãos

)Hino Homérico a Deméter, trad. C. Leonardo B. Antunes -
troquei um ponto por uma vírgula(


 

16/12/2023

Canção do hímen


Ah se aqui fosse a terra dos poentes breves, sanguíneos,
As mãos plátanos de água sobre os limos,
Coroava o cimo das montanhas, com líquidas estrelas,
Diamantes lapidados ao Senhor das Selvas



 

15/12/2023

14/12/2023

Visto que descendo

de rios impossíveis
e me deixo levar em pleno inverno
pela torrente branca das tempestades
lavando, rapidamente, os olhos túrgidos das hienas,
exalto a vertiginosa aurora das nuvens - eu,
que nasci de uma noite com dramas antigos.


 

Assim chegámos à cidade


onde não fomos entendidos


"Frente à complexidade de urn organismo e à multidão quase infinita de análises e de sínteses entrelaçadas que ela pressupõe, nosso entendimento recua desconcertado."


(H. Bergson, A evolução criadora)


 

13/12/2023

Nem sempre a cidade é um espelho


"Em Bersabéia, transmite-se a seguinte crença: que suspensa no céu existe uma outra Bersabéia [...] e que, se a Bersabéia terrena tomar a celeste como modelo, elas se tornarão uma única cidade" 

(Calvino, As cidades invisíveis)

 

11/12/2023

Ali onde a circunstância


da natureza excitava mitos provisórios


 

Da espera e da aranha


Uma aranha espera.
Fixa. Imóvel.
Tece a teia por dentro
Na calma vazia.

Os teus olhos
Cheios de noite:
Palavras como vento...
Escrava fiel e só
Pousas em paz
O longínquo conteúdo.

Eterno instante e nunca
O tempo foi grande.


 

Nenhuma rejeição dos sentidos:


eles também falam do que não se vê


 

10/12/2023

Pensando palavras por imagens - pujante? A natureza da flora...

pujante vem do francês e significa, nele, o mesmo que possante em português: aquele que pode, que é capaz e que possui. 
A pujança nem sempre é vital, ou sinónimo de vitalidade. Por exemplo: um ditador é possante mas anti-vital e, na verdade, vai neutralizando a vitalidade para dominar, ser o dono, não no sentido original do senhor da casa (o mais velho da domus), mas no de quem tem o controlo de tudo, mais próximo, por isso, do condutor, duque, do que conduz, aliás sem o 'com', só dux. O monarca e o príncipe, ao contrário do duque, inferior a eles na escala social, colocam-se acima dele, são altos, altíssimos. O monarcha porque se enlaçou com o princípio, fazendo o que faz acordado (ou seja: de coração) com ele;. O prímcipe o que vai nesse caminho, captando primeiro que os outros o princípio, mas ainda só captando, sem estar alimentado por ele em consciência de o ser.

A natureza da flora não tem mando, mas vida. Pode ser pujante e frágil. Atira-se para fora da semente e gera depois a semente que vai germinar. Vem de dentro para fora manifestando-se. Explode alimentando-se e só alimentando. O que determina a natureza é quase o que determina o homem: este põe-se em pé para sair de si; aquela (natureza floral), brota, salienta mesmo que humilde. A monarquia pode ser floral, encaixa-se e acorda-se com. A natureza floral é democrática, popular, aberta, singular e fractal. A monarquia pode, portanto, acordar-se a anarquia no sentido etimológico das palavras.



 

O acaso não, Kundera. O inesperado, no entanto, reconhecido:


“Só o acaso pode ser interpretado como uma mensagem. Aquilo que acontece
por necessidade, aquilo que é esperado e que se repete todos os dias, não é senão
uma coisa muda. Somente o acaso tem voz”

(Milan Kundera. A
Insustentável Leveza do Ser)


 

05/12/2023

Dizia Epicteto:

"Abre os teus olhos: olha as coisas pelo que realmente são.
[...]
As coisas e as pessoas são o que são."


 

02/12/2023

Pelo menos havia um rumo a seguir,

dizem os nostálgicos. Mas a causa dessa nostalgia qual é? Sempre seguimos um rumo. A nostalgia é a de uma direção pré-determinada, fixa, que só se alteraria num momento de absoluto descalabro ou de muito evidente (passe a expressão, porque a evidência não tem graus), de muito evidente desadequação. 

Há sempre um rumo. A condição humana é a da fronteira entre 'destino' e 'escolha', a da liberdade. Mesmo a Igreja reconhece. Basta ler com atenção, por exemplo, as entrevistas do cardeal e Papa Ratzinger (Bento XVI). O rumo, porém, sem prejuízo de um Deus todo-poderoso, nem por esse Deus está definitivamente traçado, pois depende da nossa atitude o capítulo seguinte da novela. Há sempre uma direção que se toma, só que não se toma nem sempre a mesma, nem sempre previamente, e por isso temos que manter a abertura necessária para percebermos o passo a dar após o que já demos.

O que não nos impedirá de vincarmos o percurso, como quem assinala com pedras para que os outros saibam por onde foi e percebam porquê.


(padre francisco)

 

29/11/2023

Era uma casa muito engraçada

com uma nesga a abrir
para um pedaço do céu


 

Um livro é um perigo



segundo Cioran. Pelo menos, devia ser. É isso que às vezes me parece estar fazendo aqui: um perigo diário, fragmentado, inacabado por condição.

 

28/11/2023

O ritmo aleatório da degradação

permite chamar paz ao que esmorece?


 

O poder poético


faz falar, não é? Ressuscita ou rePresenta, em face e no fundo, 
mesmo a vida e o alcance inalcançável
até do que é fixo, inamovível e transporta




 

27/11/2023

Fui ver o triângulo infernal -

afinal estava tudo no mesmo lugar


 

Semelhanças de família


"E tal é o resultado desta consideração: vemos uma rede complicada de semelhanças, que se envolvem e se cruzam mutuamente. Semelhanças de conjunto e de pormenor"

)Wittgenstein, Investigações filosóficas, § 66(

 

26/11/2023

Cirurgia aleatória


 

Ego e transcendência


O cérebro é a parte do corpo que reúne e coordena as perceções e, portanto, resolve, decide. Pela sua atividade extraordinária percebemos que existe alguém de onde vêm tantas sensações e um «eu» que as trabalha, toma decisões, age ou manda agir. É claro que registamos recorrências e, pelos registos familiares, pessoais, culturais, somos levados a formar uma ideia geralmente fixa de nós próprios: existe uma pessoa que é 'assim', tem certos contornos, comporta-se de certa maneira, tal como tem o nariz torto ou comprido, com semelhanças com o de outros membros da família. Apegamo-nos a isso como se precisássemos de uma tábua de salvação, como se estivéssemos para naufragar. E não estamos. Estamos apenas a ver-nos, a apercebermo-nos e a conferir com registos anteriores que nos atribuem e nos atribuímos antes. E continuamos processando. Aí não há espírito, sopro divino, que se perceba, é o corpo no mundo agindo, coordenando-se, providenciando o necessário para continuar a agir. O que nos toca sem nos apercebermos, de que damos conta só depois e como reminiscência de uma fímbria de nuvem longínqua, não sei que imagem seria apropriada, penso que nenhuma, o que nos tocou sem percebermos e talvez acompanhe toda a extraordinária atividade do corpo com seu cérebro, isso é que, não tendo nome que lhe possamos atribuir, isso é que é transcendente. 

Nesta perspetiva, a imagem que temos de nós próprios, para ser autêntica, é dinâmica, vai se transformando constantemente. Não existe uma coisa chamada «eu», uma carapaça, máscara, perfil, ao qual adequamos decisões. Aliás, segundo a neurobiologia vem descobrindo, o cérebro decide antes de pensarmos que tomámos uma decisão. Tomamos é, depois, consciência de que esse organismo que nós somos decidiu e chamamos a isso tomarmos uma decisão 'sobre o assunto'. 
Perante o que não faz qualquer sentido qualquer atuação que se baseie em uma identidade fixa, de contornos específicos ou diacríticos, definidos e inamovíveis, ou minimamente, ou fragmentariamente, modificáveis, sem os quais a gente é como se deixasse de existir, os quais nos foram legados assim, em pacote embrulhado, por sagrados antes passados. Os registos necessários estão na memória viva, não fazem falta para construir muros, porque não são necessários muros (eficazes também não são). Os registos reativam-se, reavivam-se e transformam-se em função da utilidade imediata e da prevenção percebida como necessária. Não precisamos deles como de uma fortaleza contra os invasores. Precisamos é de estar atentos e de nos reinventarmos em função do que percebemos, com a devida e suposta assistência de um espírito impercetível - ou quase - que é também amor, porque não agride nem invade, coliga-se.

 

25/11/2023

Provérbio


Os que partiram 
deixaram os nomes

 

Caminho abandonado

para o velho moinho... 


Um dia d'estio, de sol dardejante, 
As roupas cobertas de terra e de pó,
Perseguia o fugidio trilho errante
Dos filhos dispersos da mis'ra Judá - 
Peregrino do Amor no silêncio atroz - 
O místico raiar no semblante da Fada.

Só o moinho 
abandonado 
lhe recolheu a voz
das jovens morenas
que ali vinham cantar.

(aperfeiçoando uns versos desconhecidos de Furtado Coelho, entre sorrisos e prantos)