O dirigente da Comissão Nacional Eleitoral esteve profundamente comprometido com a fase mais repressiva do monopartidarismo, no fim dos anos 70. Talvez por isso tenha sido escolhido para o cargo em 2008. A equipa de observadores da UE, chefiada por Luísa Morgantini, concluiu agora o seu relatório. Aponta muitos casos concretos que indiciam uma falsificação das eleições em larga escala (incluindo taxas de participação de 108%!), dando portanto razão às denúncias da UNITA, da FPD e de outros partidos oposicionistas. Desmascarado, o repressor respondeu dizendo que o relatório estava fora de prazo, devia ter sido entregue logo e, como foi terminado só agora, não merece comentários. Perante isto, jornalistas facciosos como Luís Fernando, que O País pôs à frente das suas isentas páginas, ainda continuam a afirmar que a fraude não existiu, que a votação foi tão expressiva que falar em fraude não faz sentido. Estamos no reino da impunidade, não haja dúvidas. E estes senhores é que estão fora do prazo, porque não se constrói nenhuma democracia com mentalidades destas.
Publicação em destaque
Átomos estéticos são também cognitivos
“Quando vemos algo além de nossas expectativas, pedaços locais de tecido cerebral geram pequenos ‘átomos’ de afeto positivo. A combinação ...
21/12/2008
3 notícias de Angola
O Ministério da Família e da Promoção da Mulher promoveu um estudo que chegou à conclusão de que "parte das famílias angolanas vive de restos". O estudo parece que se resumiu aos frequentadores do Roque Santeiro, e é pena. Mas o próprio Ministério reconhecer o problema, ainda que metonimicamente, é já um avanço. Pode ser que agora, e com as pressões que tem havido no sentido de democratizar os benefícios do desenvolvimento, pode ser que o governo tome decisões e as concretize para minorar a fome no país.
Segunda notícia: o político oposicionista Carlos Leitão partirá para o Brasil (São Paulo) para se tratar. A prisão ficou, por agora, ultrapassada. Por seu turno a UNITA demonstrou uma solidariedade pública e efectiva a Carlos Leitão - a oposição começa a acordar?
Terceira notícia: vai finalmente começar a recuperação do Aeroporto 4 de Fevereiro em Luanda e vão recomeçar também as obras do novo aeroporto, a 40 km da capital. As empresas envolvidas são a Somague (Portugal) e a Odebrecht (Brasil)...
20/12/2008
o conspirador
Uma excelente surpresa o livro de Jaime Nogueira Pinto, Jogos Africanos. Por muitos motivos: em primeiro lugar a narração vai seguindo a par de referências literárias e cinematográficas enquanto nos conta episódios e peripécias como se fossem parte de um filme de espionagem ou coisa parecida. É coincidente com a actuação do autor-protagonista esta encenação constante, para além disso cria suspense e aumenta a adesão do leitor, a concentração na leitura. Ainda neste campo (da arte literária) o discurso é escorreito, fluente, próprio de um bom conversador.
Não sei se por causa da percepção tipo filme de espionagem, por vezes são-nos dados pormenores que é estranho estarem ali, como por exemplo quando se diz a escada, mais ou menos os degraus, se depois se virou à esquerda ou à direita, quantas portas se passou até entrar no gabinete, a descrição pormenorizada do gabinete e da posição em que nos recebem, etc. Isso contribui para o fílmico do livro mas parece também contribuir para a verossimilhança, para nos provar que realmente o autor esteve ali, que nos está a contar a verdade.
Surpreende também agradavelmente a sinceridade, a franqueza com que assumiu e assume ali as suas opções políticas. Outro ponto positivo: a correcta nomeação da 'guerra de independência' ou da 'guerra d'África' conforme a perspectiva em que se coloca.
Nota-se a sua atracção por personalidades fortes e a condescendência para com regimes autoritários africanos (não colhe, a meu ver, o argumento de serem estados novos - isso cria uma tendência, vê-se, mas não uma fatalidade).
É também muito interessante o desfile de informações que nos dá, vindas do 'outro lado' (o da UNITA, da África do Sul, dos EUA, dos neo-conservadores) e perda de mágica ou magia que leva os seus aliados a afastarem-se de Savimbi depois da morte de Tito Chingunji e de Wilson Santos. Interessante, aliás, a investigação que o autor faz sobre essas mortes. Interessante ainda como ele explica o desastre eleitoral da UNITA e os traços da personalidade de Savimbi que vão depois (quando se afasta de conselheiros independentes) contribuir para a rápida queda.
Enfim, vale a pena ler e está à venda em Angola.
19/12/2008
ângelo monteiro: o suplício do duende
"No meu coração ressoam árvores
Ignoradas da Terra. E entre seus ramos
Dispersa o Duende a lâmpada dos olhos:
Na insónia cuja chama não se apaga.
Não conto com as raízes dizimáveis
Das árvores da Terra. Mas com as árvores
Que fincadas mais fundo têm a garra
De latejar sem trégua no meu sangue.
Não cessa de arrastar-me em seus clamores
O Duende insone sob a sombra delas:
O Duende de corpo lancinante
E a alma perdida nas canções da Terra."
(Todas as coisas têm língua: seleção poética, Recife, CEPE, 2008, p. 266)
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