Concha de canguru

 barriga de freira

Um dia já fui rio

e fluxo e brilho

 

Senhores, aquele cacimbo, frio,

o vento sulino a varar-nos a pele... 

- recolhia a concha

do Verão por dentro

de onde saíram

as areias quentes. 

Aquele inverno, 

cacimbo cerrado, 

levou com ele

o lixo, excessos

desprevenidos

do Verão. 

Só quando limpos

nos lembrámos da concha

de onde saímos.

 

Cabelo ao vento

aquém do tempo

Ressaca -

o mar chegava até ali

(tenho ouvido aqui chamar ressaca a um prolongamento do mar, ondas que se alongam até às dunas e pelos caminhos entram na zona urbana. É impressionante a energia dessas ondas)

 

Arqueologia do acaso

 

Estávamos quase lá

e a areia apagava a marca dos teus pés

 

Verão: os dias

forravam-se de luz pela manhã

 

Linhas de luz

a levantar o dia

 

Um voo

A cerrar as pupilas. Sobre a teia 

De sombra-e-luz, no chão, bailam irreais 

Teus inquietos sentidos. Uma areia 

Vibra no ar teus hálitos e sais, 

Numa réstea que, súbito, a incendeia. 

E tudo isto vem da tua ausência. 

Até a exacta, viva, consciência

do tempo

(excerto de Renque de Copas Verdes, de M. António. A primeira e a última frase estão cortadas)