O constitucionalista Adérito Correia acha normal que, antes da eleição para a Presidência, seja mudada a Constituição do país. A 'normalidade' vem de não se poder eleger o Presidente com um figurino e depois, logo a seguir, mudar esse figurino. A. C. diz que há legitimidade igual em ele ser eleito pelo parlamento ou directamente (lembro-me da campanha das 'directas já' no Brasil, uma bandeira do fim da ditadura militar). Tudo bem. Também concordo com o modelo presidencial e acho que o eleito será o mesmo, mas não é o mesmo ser eleito por sufrágio directo ou num parlamento onde o partido maioritário detém 81 vírgula tal por cento. Se os deputados disputam a eleição directa, o Presidente deve fazê-lo também - até para sabermos que percentagem da população se arrependeu já do voto no MPLA e para darmos lugar à diversidade na escolha.
O problema está nisto: se não é correcto eleger um presidente e logo a seguir mudar a Constituição, será correcto eleger um parlamento sem avisar a população de que a nova assembleia se destina a mudar a Constituição? Será correcto, em função das legislativas (que não foram constituintes), escolher e nomear um governo que, antes de um ano, terá de ser reformulado para o novo figurino presidencialista?
Não nos esqueçamos do mote da campanha: servir o povo melhor, fazer as coisas funcionar, incrementar o desenvolvimento e os projectos sociais. Para convencer o povo se asfaltaram as ruas à pressa, se deu aquela aparência de que íamos caminhar a passos largos para uma superior qualidade de vida. Mas ninguém nos disse que, afinal, logo a seguir, iam mudar a Constituição em aspectos tão fundamentais quanto a eleição do presidente e o cariz do regime (presidencialista, parlamentar ou semi-presidencial como é agora).
Isto é o que se pode chamar um golpe de estado 'jurídico'.