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Átomos estéticos são também cognitivos

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09/11/2009

viriato da cruz mesa de trabalho

gustavo costa na hor@gá

"Temos medo até de mortos, como o demonstrámos esta semana com o vergonhoso fantasma envolto na tentativa de atribuição do Prémio Nacional da Cultura, na disciplina de literatura, a Viriato da Cruz!" -desconhecíamos isso aqui em Benguela... Uma senhora passou pela janela e disse que não viu nada.

ambulância

datas

9 de Novembro de 1799: acabou a Revolução Francesa. 9 de Novembro de 1938: noite de cristal (de 9 para 10 de Novembro), em que os apoiantes de Hitler (já no poder) matam perto de 100 judeus, destroem 267 sinagogas e 7500 lojas para limpar a Alemanha da lama do judaísmo. 9 de Novembro de 1989: queda do Muro de Berlim. Hoje?

nicolau saião viu o seu demónio

ATÉ AO FIM

Quando entrei na sala vi num relance que o meu demónio

estava deitado

A boca entreaberta, um resto de baba no queixo de quem

Dorme justamente como um anjo.

A janela pouco cerrada e o sofá chegado

à plena luz

A manta já antiga azul e amarela roçava o chão como se

Tivesse havido por ali discreta borracheira dominical.

Congeminei

Que ele antes de reentrar vindo do etéreo passara

por uma tasca ou que

aceitara a oferta toma lá dá cá de um qualquer maltrapilho

Cheio àquelas horas entradotas de uma modesta

fraternidade bebedora.

Olhando bem via-se-lhe contudo no rosto

uma vaga felicidade

Dizendo melhor uma centelha de contentamento

ou alegria, ou

assim como que a sensação de quem vira o mundo

no seu lugar real

Vamos a ver, no fundo a lonjura dominava

Como se visse o cavalheiro por uns binóculos ao contrário

Cheirava um pouco a flores e vagamente

a desodorizante

Um livro tombara no chão, ficara à espera

aberto anquilosado

Quando abri a porta da cozinha vi sobre

o fogão um tacho com

Uma iguaria qualquer com que se entretivera

certamente antes de cair no leito vencido

talvez pelas canseiras das últimas horas.

Se minha mãe estivesse viva decerto

lhe teria aplicado um raspanete

Uma expressão em dialecto se calhar

um tabefe levezinho. O meu pai

Poria na cara aquele sorriso suave dos dias sem idade

Lá fora estrepitavam ruídos da cidade barulhenta

Contos do dia e da noite, o irresistível

fascínio do desconhecido.

Sentei-me, a angústia apoderara-se de mim. Uma frase estranha

Revirava-se-me na cabeça.

Quando olhei pela janela o horizonte

pareceu-me uma linha ténue.

Mais tarde, pensei, falaríamos a preceito. Ou antes

por entre dentes eu diria talvez

coisas sobre a grande aurora ou então sobre a memória

Sibilina dos sobreviventes imutáveis.

bp mps

alda lara testamento


À prostituta mais nova 

Do bairro mais velho e escuro, 
Deixo os meus brincos, lavrados 
Em cristal límpido e puro...

E àquela virgem esquecida, 
Rapariga sem ternura, 
Sonhando algures uma lenda, 
Deixo o meu vestido branco, 
O meu vestido de noiva, 
Todo tecido de renda...

Este meu rosário antigo 
Ofereço-o àquele amigo 
Que não acredita em Deus...

E os livros, rosários meus 
Das contas de outro sofrer, 
São para os homens humildes 
Que nunca souberam ler. 
Quanto aos meus poemas loucos, 
Esses, que são de dor 
Sincera e desordenada...

Esses, que são de esperança 
Desesperada mas firme, 
Deixo-os a ti, meu amor...

Para que, na paz da hora, 
Em que a minha alma venha 
Beijar de longe os teus olhos, 
Vás por essa noite fora...

Com passos feitos de lua
Oferecê-los às crianças
Que encontrares em cada rua...