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Átomos estéticos são também cognitivos

  “Quando vemos algo além de nossas expectativas, pedaços locais de tecido cerebral geram pequenos ‘átomos’ de afeto positivo. A combinação ...

29/07/2009

toyin adewale gabriel escritora nigeriana

(v. poema mais abaixo, num dos meses anteriores, traduzido)

st

governo angolano nomeia novos reitores

As equipas reitorais das novas universidades públicas acabam de ser hoje aprovadas pelo governo angolano. Para a Universidade Katyavala Buila (a universidade pública de Benguela) foram nomeados Paulo Horácio de Sequeira e Carvalho, reitor, Manuel Francisco Bandeira, vice-reitor para a área académica, Afonso Dala Coxi Fula, vice-reitor para a área científica, e Ermelinda Monteiro Silva Cardoso, pró-reitor para a cooperação, de acordo com o comunicado da reunião do Executivo. Paulo de Carvalho já esteve à frente, num período difícil, da Faculdade de Letras da UAN em Luanda, onde realizou uma gestão rigorosa. É um sociólogo conhecido, respeitado, com uma carreira científica a todos os títulos louvável e bibliografia a comprová-lo. Deu recentemente uma entrevista explosiva sobre o estado lastimável do ensino superior em Angola, pondo o dedo em todas as feridas. Acredito que foi uma excelente escolha. Manuel Francisco Bandeira é um homem dialogante, agradável, respeitado, com currículo académico (é doutorado) entre a Economia, a Geografia e a Ecologia Humana. Parece ter perfil adequado à função. Afonso Fula não conheço. Ermelinda Monteiro da Silva Cardoso é o que se pode chamar uma senhora: sabe estar, sabe colocar e colocar-se, é uma veterana do ISCED de Benguela e do CUB (onde presidia à Assembleia Geral) e possui o grau de Mestre. Parece-me uma boa equipa. Mãos à obra.

Instituto Camões, Portugal, novo pacote legislativo

Acaba de sair legislação portuguesa regulando as atividades, a constituição e o funcionamento, quer do Instituto Camões, quer do ensino de língua e de cultura portuguesa no estrangeiro. Para quem trabalha no ensino e na formação de professores de português é um pacote a levar em conta, naturalmente.

A nova legislação fazia falta e era esperada há muito. Para além das alíneas me parecer positiva e clarificadora, há dúvidas e discordâncias que me parecem fundamentais. Transcrevo:

Realmente há coisas interessantes que parecem mudar para melhor, por exemplo a concentração do ensino de português no estrangeiro toda no Camões, que seria plenamente melhor se se limitasse a coordenar as ações ao nível do Ensino Superior pelo menos, não privilegiando ações do Instituto mas coordenando as que a comunidade académica e docente em geral pode oferecer com garantia científica, pedagógica e técnica que dispensa duplicação de despesas do Estado português.

A passagem do pessoal do ME português para o Instituto Camões, que me parece lógica em se tratando de gente ligada ao ensino de língua e cultura portuguesas no estrangeiro) é outro aspeto positivo e importante, que dá mais coesão à atuação do Estado português.

O Conselho Estratégico é fundamental, mas não faz sentido nenhum, havendo este, manter outro, meramente consultivo e constituído quase pelas mesmas entidades.

Há duas ausências notórias. A primeira, não se fazendo referências ao Instituto Internacional de Língua Portuguesa, criação dos países lusófonos sediada em Cabo Verde, neste momento dirigida por uma linguista angolana (a Prof.ª Amélia Mingas). Parece-me um parceiro, não só desejável, que devia ser considerado incontornável no esforço para a promoção da língua portuguesa nos países lusófonos pelo menos.

Também não se fala no novo acordo ortográfico. Não concordo com a amálgama de critérios ali usada, com as incoerências já sublinhadas e não corrigidas, mas ainda assim o Acordo é um instrumento precioso na divulgação e no ensino da língua portuguesa. Talvez não viesse a propósito falar disso num Decreto, ou talvez sim, tanto mais que Portugal está num período de preparação para a aplicação plena e definitiva do mesmo.

A verdade é que cabe ao IC um papel fundamental na aplicação do novo Acordo Ortográfico e os docentes do IC, que em geral o desconhecem, à priori rejeitam a sua aplicação, o que pode gerar conflitos e confusões numa área sensível em que o Brasil, em certos países, está plenamente preparado para substituir Portugal.

Passando mais especificamente ao novo pacote legislativo:

Para variar há algumas incoerências e oscilações. Aquela entre "coordenar" ou "estruturar" ou "propor e executar" é das piores. Em meu entender o IC devia tão somente coordenar e deixar às instituições existentes e preparadas para isso (como as Universidades, as ESE's) as tarefas de propor e executar, apenas com a gestão financeira dos projetos acompanhada de perto pelo IC.

Reparem, a propósito de incoerências, no art.º 1.º do decreto republicado (Decreto -Lei n.º 119/2007): "1 — O IC, I. P., tem por missão propor e executar a política de ensino e divulgação da língua e cultura portuguesas no estrangeiro, assegurar a presença de leitores de português nas universidades estrangeiras e gerir a rede de ensino de português no estrangeiro a nível básico e secundário, em coordenação com outros departamentos governamentais, em especial os Ministérios da Educação, da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e da Cultura." 1ª pergunta: o que fazem aqui o MCTES e mesmo o da Cultura? Era necessário precisar, uma vez que não se fala em ensino superior nem em atividades culturais.

2ª pergunta: porque se fala, no art.º 3.º, no ensino superior e depois a referência desaparece? "3 — A rede do ensino português no estrangeiro integra as estruturas de coordenação, nos casos em que tal se justifique, o corpo de docentes de educação pré -escolar e dos ensinos básico, secundário e superior." - O "superior" desaparece na passagem ao artigo seguinte... Nesse mesmo artigo 3.º se escreve que é função do IC:

"Estruturar e coordenar a política de difusão e promoção da língua e da cultura portuguesa no estrangeiro e promover o português como língua de comunicação internacional". Felizmente deixa de ser "propor e executar", passa a "estruturar e coordenar", mas a duplicação ou oscilação de que falo acima torna-se evidente. No mesmo artigo se diz ser competência do IC: "Estabelecer programas de apoio à criação de departamentos de português ou estruturas equivalentes em escolas e universidades estrangeiras e à contratação local de docentes" Pergunto-me: qual o papel das universidades portuguesas nessa ação de carater universitário? Estará o IC preparado para as substituir? Vai subcontratá-las? Vai torná-las num instrumento do governo? Vai silenciar as suas iniciativas? Vai menosprezar as mais valias acumuladas, sobretudo em termos de material de apoio e recursos humanos? Acumuladas, lembremo-nos, com dinheiro do Estado português.

Se nas universidades há departamentos preparados para realizar essas tarefas não é melhor apenas coordenar a ação deles em termos de gestão financeira e de recursos? Pergunto-me ainda: porque se volta aqui a falar em ensino superior e lá atrás não se incluiu o ensino superior? As mesmas duas perguntas, sobretudo a primeira, faria relativamente à alínea m): "m) Desenvolver e coordenar a actividade de formação de professores nas áreas da língua e cultura portuguesas;" Se isso implica intervenção ao nível do ensino superior e no estrangeiro, qual o papel das universidades portuguesas, que têm pessoal preparado para realizar essa tarefa? Qual o papel do IC e como irá arranjar o pessoal? Irão os leitores substituir os professores universitários que entretanto se preparam para isso? Isto não implica duplicação de custos?

Ainda: qual o papel das universidades estrangeiras? Pergunta esta que se prende com a pretensão de várias leitoras do IC de reservarem para si e o Instituto o exclusivo da criação de cursos de formação de professores de português em países lusófonos, que portanto possuem o português como língua oficial e organizaram-se já de forma a criarem esses cursos com recursos próprios, como é natural em países independentes. Acho que deviam precisar o tipo de atuação para os países lusófonos, que não pode ser o mesmo que para os outros. Para além disso deviam reportar-se aí, de forma explícita e categórica, ao Decreto -Lei n.º 165/2006, republicado e creio que modificado nesse pacote legislativo, que diz no art.º 3.º que "na organização do ensino português no estrangeiro, prevalece o princípio da sua integração nas actividades reconhecidas dos sistemas de ensino dos países estrangeiros" (já agora, aquela primeira vírgula está a mais; num Decreto-Lei é inadmissível colocar uma vírgula entre sujeito e predicado, ainda por cima num Decreto sobre o ensino do português). Também o art.º 13.º me parece perigoso, na medida em que prevê que o IC "pode criar, participar na criação ou adquirir participações sociais em entes de direito privado que revistam utilidade pública, em Portugal ou no estrangeiro"- Por si não é mau, mas é perigoso se se atuar "precedendo autorização dos membros do Governo responsáveis pelas áreas dos negócios estrangeiros e das finanças". Parece-me positivo que seja "o director do centro [...] recrutado por escolha de entre membros das representações diplomáticas ou consulares, obtida a concordância do titular da mesma representação, e leitores, com experiência e currículo relevantes na área da gestão e divulgação cultural" - caso no entanto a exigência curricular feita aos leitores seja também feita aos "membroas das representações" (art.º 3.º do Decreto-Lei n.º 165-B/2009). Parece-me que "dezasseis a dezoito horas" semanais é um horário letivo muito pesado para um professor universitário, ainda mais levando em conta as funções complementares que exercerá o leitor e que estão previstas nos diplomas. É possível que o disposto nestas linhas

"Em caso de cessação da comissão de serviço por iniciativa do docente antes do final do ano lectivo, este deve suportar os custos de viagem e de transporte de bagagem"

constitua limitação de direitos que são consignados ao docente, pois estará a ser penalizado por uma decisão que tem o direito de tomar.

E, de momento, é isto que o pacote legislativo me suscita. Junto com apenas mais uma pergunta: porque motivo não foi perguntado aos agentes no terreno o que achavam destas propostas? Não seria mais humilde e mais eficaz?

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28/07/2009

carla piairo freedom

contos de antologia

António Fonseca publicou no INALD, por si dirigido, a coletânea Contos de antologia. Como se expõe logo de início, trata-se de uma obra que resulta de um programa radiofónico, iniciado em "Fevereiro ou Março de 1978". Para o que vou dizer é fundamental citar a intenção do programa: "pretendia-se a existência de um programa que tratasse de questões ligadas à valorização da Tradição Oral Africana e, particularmente, angolana". Mais adiante se diz: "cremos que, analisados os problemas que hoje se colocam à Cultura Nacional, o lançamento do programa terá sido uma forma de reconhecimento que na Cultura Nacional residem os fundamentos em que se ergue a Nação Angolana". O autor sabia "que a literatura oral não se desenvolve apenas nas comunidades tradicionais nem apenas nas línguas nacionais e que por vezes incorpora elementos oriundos de outras histórias e de outras culturas e alguns são mesmo novas criações para responder a necessidades específicas", eu diria, a situações específicas e também elas novas. Os contos são realmente representativos. "São contos originários de diversos complexos sócio-culturais angolanos, são próprios das comunidades históricas que constituem o povo angolano". O resultado, a volumosa antologia, é soberbo e muito profícuo para análises literárias e culturais. Desde logo obriga o antologiador, atento, a falar em "literatura oral antiga", portanto a separar uma oratura antiga de outra mais recente, o que é um grande passo em frente. Na verdade, só pensamos em literatura oral antiga, essa que vemos nos livros de recolhas de contos "populares", "tradicionais", etc.. No entanto circula, principalmente no meio urbano, toda uma outra oralidade, bem mais fluída, muitas vezes bem mais viva, instável tanto quanto a complexidade das novas e populosas cidades. É aí, ou por efeito cuja causa está aí, que vemos serem veiculadas "novas ideias que nada têm a ver com as sociedades tradicionais". A força da oralidade reside mesmo nessa apropriação de elementos 'modernos' e 'exógenos' e tal apropriação constitui de facto uma resposta saudável dada pelo nosso povo às preocupações dos intelectuais nativistas. O que lemos nesses contos é sintomático do estado mental do povo. E o povo não tem problema nenhum em misturar, sabe fazê-lo. Já na literatura oral antiga, de que há bastos exemplos na antologia, o tivera feito. Por exemplo naquela estória do rei que tem uma filha que é raptada (ou adoece, enfim, precisa de ser salva). Estórias estruturalmente afins encontramos, para citar apenas um caso, na Granada ibérica, berbere e árabe. Há outras, no acervo nacional angolano, reportadas já em Heli Chatelain, aparecem a figura do Governador e outras ligadas à colonização portuguesa. Essa criatividade transforma as antigas estruturas míticas, de maneira a que possam apropriar elementos exógenos e modernos. Umas vezes (a maoria das vezes, calculo) o mito mais antigo é estruturante; outras vezes as próprias estruturas tradicionais, míticas e morais, vão sendo alteradas também. E a realidade cultural do povo angolano é esta, profunda e livremente híbrida. O que dá o sentido mais forte, literaria e culturalmente falando, ao uso que faço do termo e do conceito de crioulidade, quer para me reportar à formação da literatura angolana, quer para falar de uma identidade agregadora que desde muito cedo começa a pensar e chamar os angolanos, angolenses, filhos da terra, etc. - como de resto aconteceu nos mais diversos países, principalmente da África e da América. Dizer, perante isto, que a crioulidade em Angola não existe, ou que está mitigada nos ensaios de alguns intelectuais, é meter a cabeça debaixo do chão para não ver o que se passa. Políticas de avestruz aplicadas à cultura a sul do Senegal indiscriminadamente.

paisagem marítima

27/07/2009