Há pessoas que, pela maneira de estarem connosco e pelo tempo em que estão, deixam sempre um vazio, mais concretamente: um buraco, o da sua falta. O passamento de Claude Lévi-Strauss, porém, não foi só isso. Pedi a José Manuel Martins, professor de Filosofia na Universidade de Évora, autorização para transcrever as suas palavras acerca disso:
"Lévi-Strauss estuda-se ao mesmo tempo como uma figura intemporal da Plêiade, como um pensador contemporâneo pertencente à época exactamente antes da nossa - e como uma figura e um nome históricos que inacreditavelmente ainda está vivo, e intelectualmente activo. Quando um homem assim morre, um homem que sobrevivia a si próprio teimosamente, e um homem cujo pensamento é como que uma espécie de amabilidade da palavra e do sentido devotada aos homens, à natureza, aos seres, a cada coisa (ele, o suposto estruturalista abstracto, mas que dizia: "un peu de structuralisme éloigne de la réalité, mais beaucoup y ramène"), o que se sente - o que eu sinto - é a perda de um pensamento amigo, de um pensador amigo, de uma presença viva e amical que ainda nos tutelava, sage, na sua grande idade, velando por um pensamento incrivelmente clássico e equilibrado que com ele, dos últimos, se nos perdia.
Acompanhou alguns anos de curso da licenciatura de filosofia, simultaneamente como um autor no tempo e fora dele: plenamente estruturalista. Às vezes passo, em Cascais e em Lisboa, pelas casas que Eliade habitou. Nunca perdi a esperança de um dia fazer estruturalismo entre as obras divorciadas de um e de outro, duas escolas e duas europas que não se falavam, à semelhança dos índios da Colúmbia Britânica e da linhagem de Édipo e Laios, que só se encontram uns com os outros no célebre baralho de cartas com que a velha raposa jogava aos mitemas sem sair de Paris.