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28/09/2009
26/09/2009
jorge mendes macedo
O dia começou estranho, viciado em contratempos. Cerca das 12h me ligam de Lisboa a dizer que o Inácio Rebelo de Andrade morrera na semana passada. Huambino, co-fundador e responsável da col. Bailundo com Ernesto Lara filho, sugeriam-me até que escrevesse uma nota fúnebre. Investiguei e talvez não tenha sido ele quem morreu. Quando me convencia já disto, ligam-me a dar a notícia da morte do Jorge Macedo (por acidente cardio-vascular), que logo vejo na TPA. Foi outro choque. Por diferença de ideias (discordávamos em quase tudo) algumas vezes nos zangámos, mas éramos amigos e fomos companheiros na direção da Casa de Angola em Lisboa, onde trabalhei apoiando-o no sector cultural, sob o comando geral do mais velho Edmundo Rocha. Tertulizámos muito com o Tomás Jorge, que também faleceu há pouco. Também o acompanhei quando em Portugal andava mal e sozinho, não tendo mais amparo que o Dr. Edmundo e o Tomás Jorge, acusado de muita coisa injustamente. Mais tarde em Luanda nos revíamos, com o Virgílio Coelho e, quando ele veio cá, com o Tomás Jorge outra vez. Recordo-me particularmente de uma soberba funjada no Kinaxixi - eu, ele e o Tomás - antes de irmos discursar e declamar no ISCED de Luanda. Lembro-me também da altura em que ele refilava à toa (pelo menos assim me parecia), particularmente com um miúdo que andava muito pelo Kinaxixi, dizia-lhe seriamente que "andas-me a espiar, é?, andas-ma escutar? seu bandido, julgas que eu não sei que és da bófia?". Repetiu isto muitas vezes e, de repente, nunca mais falou nada sobre o assunto. Passou-lhe. Lembro-me também das nossas conversas sobre literatura, não sobre ideologias literárias, mas sobre literatura mais propriamente e sobre marimbas e cultura tradicional kimbundo. São recordações destas que prefiro guardar, meu kamba. Muitos te farão o elogio fúnebre e bibliográfico. Está certo. Mas eu não faço. Fico-me por aqui. Recordando o poeta das harmonias, sobretudo na sua primeira fase, o animador de coros religiosos, o seu amor pela música tradicional angolana e o grande amor por Luanda, sua terra de eleição. Prefaciámo-nos também, escrevemos um do outro, ficou isso gravando uma boa amizade nas páginas volúveis dos livros. À família enlutada e em particular ao Fernando Macedo aquele abraço, forte, amigo, o mesmo que nos dávamos quando nos revíamos. E que a Té Macedo cante como só ela sabe aquela mesma música feita com o pai...
25/09/2009
24/09/2009
22/09/2009
21/09/2009
20/09/2009
arménio vieira no inferno
fernando costa andrade
A pedra da Emanha
poesia tem-na a pedra o poema um outro eu sou afinal o transporte roda parada no tempo mó rasgada desassossego eis-me pedra sem ser pedra apenas uma fissura coágulo secura
Criança notívaga do Luena
o vento não diz nem o sol atrás do mundo a escuridão não distingue a criança do caminho do mundo pés descalços gémeos no silêncio do mundo nada sabem donde vêm onde vão caminham sós no mundo
19/09/2009
18/09/2009
17/09/2009
adelino torres teses
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Não creio
Que me façam feliz:
Sob o receio
De chumbo no céu próximo
Alguém executou as diretrizes
De um plano óbvio.
Um amigo acena: ao longe, brandamente...
Estar aqui, não por ser triste,
Mas por, agora,
Sermos o fogo que nos devora
De pura rebeldia a sequiosa voz.
Dois escravos libertos
Para acordar o sono atormentado
Como um porto, a soave
Mentira.
carlos ferreira quase exílio
O INIC (Instituto Nacional das Indústrias Culturais) publicou em 2003 a obra homónima de Carlos Ferreira com desenho de José Rodrigues na capa.
Carlos Ferreira é um caso particular (como quase todos) da literatura angolana. Faz parte, com Filipe Zau, daqueles escritores angolanos que também com sucesso compõem letras para música e estiveram sempre muito ligados à música – de onde lhes virá o sentido de ritmo e de harmonia mais apurado.
Fez a sua caminhada no âmbito das Brigadas Jovens de Literatura convictamente, pela fidelidade aos ideais da Revolução que professou. Daí lhe vem uma profunda amargura, a dos que se desiludiram ao verem que o rumo tomado se afastava cada vez mais da utopia. O que pulsa em quase todos os poemas do livro é a angústia de quem acreditou, viu tudo e quase todos falharem, e se retirou para Portugal (ou qualquer outro país) amargando ainda uma enorme solidão, um quase exílio.
Da vivência intensa dessa desilusão coletiva e com o coletivo lhe vem um tom pessoal, íntimo, que não estamos habituados a ver em poetas entregues aos ideais revolucionários. Isso lhe dá o lugar próprio na lírica angolana: uma poesia próxima da música, pessoal, íntima e, no entanto, assumindo frontalmente o fim de um sonho. Quando acabei de ler o livro ocorreu-me esta passagem de Gabriela Llansol: "era bem o fim de um sonho".