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31/12/2009

autobriografia

na folha negra
do fragmento
eu nasci além dos mares

bálsamo e
cena íntima
borboleta

na canção do exílio
berço e túmulo
das primaveras

na infância do rio
na voz da ilusão
na valsa da plateia

dores
clara de joelhos
deus! dores

horas tristes
amor e medo
anjo

minha mãe
minhalma triste
mocidade moreninha

túmulo dum menino
no jardim
no lar

perdão!
perfumes e amor
palavras no mar

noivado! baile
no leito
palavras a alguém

na estrada
na rede
pepita

de poesia e amor
- pois não é?
sempre sonhos

saudades
segredos
sonhos de virgem

orações
primaveras
queixumes

rosa murcha
uma história violeta
na visão da última folha.

(colagem com títulos de poemas de Casimiro de Abreu)

Apaga a luz

Esta simples frase pode provocar reações tão diversas quantos os contextos em que seja dita. Aqui menciono-a por um contexto que, provavelmente, o leitor, a leitora, não esperam. É que, em solidariedade com a saúde do planeta e a propósito da cimeira de Copenhaga, nos pedem, atentos e dedicados ecologistas, que apaguemos a luz todos ao mesmo tempo no mundo inteiro. Surpreende que o façam, pela segunda vez, pessoas que tanto pensam no planeta. Porque o planeta tem países, como o nosso, onde há aglomerados urbanos, como o nosso, nos quais haver luz à noite é de agradecer a Deus. Aqui em Benguela, por exemplo, pelo menos no meu bairro e na minha rua, não há luz há quase 48 horas e, quando houve, iluminava as lâmpadas sem que as lâmpadas iluminassem fosse o que fosse. Via-se apenas aqueles risquinhos de luz dentro da lâmpada, uma luz mortiça e a escuridão ecológica à volta – antes de ela desaparecer totalmente com o barulho dos geradores. Que sensibilidade têm estes ecologistas para nos pedirem que, dando-se o milagre da luz, ainda a apaguemos por um tempo? Concordo com os que defendem que devemos acender aqui todos a luz a essa hora, ligando geradores, fazendo o mais possível por iluminar as nossas casas.
Os meninos bonitos da última esquerda europeia continuam com seus sonhos mimados a sonhar um planeta em nosso nome sem nos perguntarem nada. Mas amanhã, quando nos queixarmos de alguém ser preso, torturado ou morto no III Mundo virão dizer-nos que não devem ser eles a pronunciarem-se sobre o assunto, que não têm o direito de dizer às ditaduras do III Mundo o que devem fazer. Isto se não chamarem o Miguel Esteves Cardoso, que acordou há dias maldisposto com o José Eduardo Agualusa e outros 'queixinhas'. Claro, dizem-no bem acomodados em almofadas democráticas, em cafés onde podem falar em voz alta sem vir nenhum delator sentar-se à mesa do lado para ouvir tudo o que dizemos e até o que não dizemos. Mas querem que apaguemos a pouca luz que nos dão para fazermos um protestozinho todos juntos e aproveitarmos para beijar a namorada no escuro, para imaginar o que seria o mundo sem luz elétrica e outras pieguices. Ó maninhos, nós aqui já conhecemos isso muito bem…